Retração gengival relacionada a próteses dentárias.
A recessão ou retração gengival pode ser a causa para o aparecimento da sensibilidade e das cáries dentárias em raízes em dentes que suportam próteses dentárias. E como diagnosticar e resolver esse problema? Este post elucida e traz informações básicas para o paciente que possui próteses dentárias em dentes com retração da gengiva.
Por Luís Gustavo Leite, dentista graduado e especializado em próteses dentárias pela Ufrgs, em Porto Alegre.
A retração gengival.
A retração ou recessão gengival é a exposição da raiz dentária pela perda do osso e da gengiva que recobrem e sustentam nossos dentes. É uma situação normal para a maioria das pessoas. Entretanto, quando essa recessão da gengiva é extensa, alguns problemas que vão muito além dos prejuízos estéticos podem aparecer e trazer riscos sérios aos dentes.
As causas da retração gengival.
As causas para a retração gengival são um dos principais objetos de pesquisas em odontologia, e a maioria delas mostram que, apesar da presença da placa bacteriana ser o fator primordial para o aparecimento e progressão da recessão gengival, na maioria das vezes existem outros fatores que são coadjuvantes para o problema.
É o que os pesquisadores chamam de doenças multifatoriais, no qual dois ou mais fatores devem estar presentes para que o distúrbio apareça. E, quando se fala em retração da gengiva, placa bacteriana, força exagerada durante a escovação, oclusão traumática, a existência de freio labial extenso e profundo, a posição e o tipo de gengivas estão entre os fatores mais associados ao problema.
✓ Placa bacteriana.
O acúmulo da placa bacteriana está presente na maioria dos casos de retração gengival. As bactérias presentes nessa placa podem provocar inflamações na gengiva e periodonto. Saber que para haver a retração da gengiva é preciso que também ocorra a destruição do osso que suporta essa mesma gengiva é fundamental para entender as causas e os tipos de tratamentos. As pesquisas indicam que, em 25% dos locais com retração gengival, há ainda a presença do cálculo bacteriano.
✓ Força exagerada pela higienização oral.
A força exagerada das cerdas da escova dentária, durante a higienização, pode traumatizar a gengiva e contribuir para o desenvolvimento e progressão da retração da gengiva.
✓ Oclusão traumática.
A recessão gengival pode ter o seu início e também a velocidade de progressão causada pelo contato traumático entre os dentes. Esse contato irregular, denominado oclusão traumática, é uma relação desarmônica de distribuição de forças de contato entre os dentes. É uma situação, entretanto, com farta documentação clínica sem comprovação científica consistente. O bruxismo, outra situação clinicamente associada à retração da gengiva, também carece de comprovação científica como causador do problema.
✓ Freio labial.
O frênulo ou freio labial é uma dobra visível da mucosa que liga os lábios e as bochechas à mucosa ou epitélio que protegem a gengiva, muitas vezes inserindo-se profundamente até o periodonto de ligação. Dependendo da extensão do freio labial há mudança na quantidade e qualidade da gengiva, criando condições ao aparecimento e progressão da retração gengival. É uma situação encontrada na arcada inferior, região dos incisivos.
✓ Tipo de gengiva e osso que circunda o dente.
Assim como a pele, cabelos e todas as outras estruturas do nosso corpo, nossas gengivas possuem com características individualizadas. Em alguns indivíduos uma parte específica da gengiva, a mucosa ceratinizada, pode aparecer mais espessa e extensa, enquanto em outros a ocorrência é mais fina e curta. Essas variações podem facilitar o início e a progressão da retração gengival. Um bom exemplo disso são as recessões gengivais encontradas em regiões boca em que a mucosa é fina e estreita a probabilidade de retração nessa área é sensivelmente maior do que a encontrada em mucosas espessas e extensas.
✓ Posição dos dentes.
Observações clínicas relatam que dentes mal posicionados podem retrair as gengivas. Os girados ou inclinados para o lado de fora das arcadas são mais propensos a desenvolver algum tipo de retração gengival do que dentes corretamente alinhados. Assim como acontece com o freio labial, são poucas as comprovações científicas sólidas que sustentam essa ocorrência tão comum.
✓ Piercings
Piercings inseridos no dorso da língua ou nos lábios podem provocar retrações gengivais severas. E o que é pior: a ocorrência de retrações da gengiva associada a piercings é de quase 40% desses indivíduos. A localização mais frequente do problema são os dentes anteriores-inferiores.
A retração gengival associada a próteses dentárias.
A recessão gengival associada às próteses dentárias é uma observação clínica comum e frequente. Muitos são os fatores que determinam esse tipo de recessão, e listamos aqui os motivos.
✓ Próteses com término grosseiro.
A região de contato entre o final da prótese e o início da superfície dentária pode não ocorrer de forma suave e ininterrupta. Quando há um degrau formado entre a prótese e o dente, essa região torna-se propensa ao acúmulo de placa bacteriana responsáveis pela recessão da gengiva.
✓ Próteses que invadem o sulco gengival.
Eliminar a linha que demarca o final da prótese e o início do dente é um desafio para o dentista, já que essa linha, além de criar um déficit estético, normalmente desagrada ao paciente. Para esconder essa linha o dentista pode localizar o início da prótese dentro do sulco gengival, eliminando visualmente essa linha. A profundidade do sulco gengival é mínima – aproximadamente 1,8 mm – e quando essa região é invadida pela bordas da prótese a gengiva inflama e, como consequência, ocorrem retrações gengivais.
✓ Alergia aos materiais da prótese.
Alguns dos componentes das próteses dentárias podem provocar reações alérgico-inflamatórios nas gengivas. Ainda não existem relatos clínicos referentes ao materiais existentes nas próteses mais modernas que não utilizam metal, entretanto, as próteses metalocerâmicas podem provocar reações inflamatórias causadoras das retrações gengivais.
✓ Próteses que dificultam a remoção da placa bacteriana.
É comum que o desenho projetado para tratamentos com uma ou mais coroas protéticas não permitam o acesso tanto das escovas tradicionais quanto das escovas interdentais ou unitufos. Para a maioria dos casos, esse bloqueio no acesso aos instrumentos de higienização devesse à busca por resultados estéticos melhorados. Se por um lado há o ganho no resultado estético, por outro ocorre a impossibilidade ou aumento da dificuldade de limpeza na região.
Diagnóstico precoce.
O diagnóstico precoce da retração gengival é difícil dada a multicausalidade dos fatores causadores da doença. Entretanto, a presença concomitante da placa bacteriana e de dois ou mais fatores pré-disponentes devem ser alertadas aos pacientes pelos dentistas – ainda que a recessão da gengiva ainda não seja visível.
Problemas que decorrem da retração gengival.
✓ Hipersensibilidade dentinária.
Atingindo mais de 20% da população adulta brasileira, o aumento da sensibilidade dentária ao frio e determinados tipos de alimentos é decorrente da exposição das raízes dentárias ao meio bucal.
✓ Cáries dentárias.
As raízes dentárias são áreas mais propensas a ter cáries dentárias por dois motivos : a dificuldade de escovação no local e a fragilidade da superfície que recobre as raízes, o cemento, tecido dental fino e pouco resistente à ação ácida da atividade microbiana presente na placa bacteriana.
✓ Abrasões e desgastes das raízes.
A superfície das raízes expostas pela recessão gengival é mais frágil que a superfície do esmalte. Enquanto as forças normais de escovação não provocam danos maiores ao esmalte, essa mesma força desgasta a superfícies das raízes, promovendo cavidades que facilitam o acúmulo de placa bacteriana.
✓ Tratamento endodôntico ( tratamento de canal ).
Quando a cavidade decorrente de abrasões e desgastes são muitos profundos pode haver a invasão do espaço aonde localiza-se a polpa dentária – região que contém artérias, nervos, vasos e tecidos.
✓ facilidade à instalação de gengivites e periodontites
A retração gengival dificulta a remoção da placa bacteriana durante a higiene oral. Além disso, a maior dificuldade na remoção da placa bacteriana pode levar o paciente a aumentar a pressão das cerdas da escova dentária contra a gengiva retraída. O resultado ? Trauma da gengiva e mais retração gengival.
✓ Perda dentária.
A recessão gengival pode levar à perda dentária quando as lesões cariosas localizadas nas raízes são tão extensas que impedem o uso de técnicas restauradoras de recuperação.
Tratamento da retração gengival associada a próteses dentárias.
O tratamento da recessão gengival associada à próteses dentária consiste na remoção e substituição da prótese problemática associada, tratamento da gengiva e, se necessário, o reposicionamento cirúrgico da gengiva. A cirurgia na gengiva visa restabelecer não somente a posição natural da gengiva, mas também prevenir o local de problemas como a sensibilidade dental aumentada, cáries radiculares, abrasões e erosões dentárias, e o acúmulo de placa bacteriana. Além disso, o reposicionamento cirúrgico da gengiva facilita a remoção da placa bacteriana durante a escovação. Já a substituição da prótese é indicada quando o desenho ou a adaptação das próteses não estão corretos – retrações associadas a próteses mais modernas, como as próteses com zircônia, não necessitam, para a maioria dos casos, de substituição.
✓ Tratamento periodontal.
O tratamento periodontal é fundamental para qualquer tipo de recessão gengival, independentemente da causa. Preciso e meticuloso, consiste em medir e registrar a extensão da retração e profundidade do sulco gengival e remover a placa bacteriana e cálculos para eliminar a presença de gengivite e periodontite.
✓ Substituição da prótese dentária.
As próteses dentárias devem ser avaliadas quanto à necessidade de substituição, e detalhes como a qualidade da adaptação ao dente são minuciosamente examinados para evitar o acúmulo de placa bacteriana.
✓ Cirurgia gengival de reposicionamento da margem da gengiva.
No últimos anos várias técnicas cirúrgicas para reposicionar ou reinserir nova gengiva sobre a raiz exposta pela recessão gengival mostraram-se eficientes. São essencialmente dirigidas para a solução dos problemas estéticos. Os resultados dessas cirurgias, independentemente da técnica utilizada, apresentam boa previsibilidade de resultados e baixa recidiva desses resultados ao longo dos anos.
A cirurgia plástica gengival de reposicionamento é simples e bem indicada para casos que exigem melhora estética antes da instalação de uma prótese dentária. Reposicionando cirurgicamente a margem gengival em direção à coroa dentária, a raiz exposta é novamente coberta por tecido gengival saudável. É indicada para pequenas retrações.
✓ Cirurgia gengival com enxertos.
É uma cirurgia plástica gengival mais complexa. Nesta técnica, coleta-se a parte interna de gengiva sadia localizada em área distante da raiz exposta – normalmente localizada no palato. Esse tecido removido é então suturado internamente à gengiva retraída, e após aguarda-se o período de cicatrização do enxerto, que varia entre 60 a 90 dias. É a técnica com maior previsibilidade cirúrgica e menor recidiva ao longo dos anos.
Correções e adaptações locais.
Muitas vezes o dentista opta pela correção anatômica dos dentes – ou atém mesmo das raízes, facilitando a remoção de placa bacteriana nessas regiões. Em outras situações, regulariza-se as imperfeições das próteses dentárias associadas à retração da gengiva, sem necessidade de substituição do dispositivo – diminuindo custos e contratempos.
Prevenção da retração gengival.
A maioria dos casos de retração gengival não tem apenas uma causa, e a uma quantidade considerável desses casos o acúmulo de placa bacteriana e tártaro gengival está relacionada. Evitar o acúmulo de placa bacteriana é fundamental, e eliminar fatores retentivos que dificultam a remoção da placa bacteriana, como as próteses dentárias mal adaptadas e as cavidades nas raízes dentárias decorrentes da própria escovação na abrasão dentária, são também importantes.
A diminuição da força de escovação durante a higiene oral é outro fator fundamental. A força não aumenta a eficiência da higiene oral. Consulte o seu dentista para descobrir a melhor forma de higienizar os seus dentes sem provocar danos às raízes dentárias e tecidos gengivais.
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