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Luis Gustavo Morato Leite

Desejo e frustração em tratamentos estéticos em odontologia: insights.


por Luís Gustavo Leite,  dentista graduado e especializado em próteses dentárias pela UFRGS, em Porto Alegre.

 

 

O significado etimológico para “frustração” até parece não fazer sentido: “contratempo, ou falha”. Ao menos, não nos dias atuais. É que, enquanto para muitos indivíduos os procedimentos estéticos são necessidades sociais e profissionais essenciais, para outros é o desejo por sorrisos impecavelmente simétricos e brancos o que está em jogo. E é exatamente aí que tem início um problema cada vez mais frequente nos consultórios dentários: a irrealidade dos desejos estéticos aliada à incapacidade contemporânea em satisfazer-se com resultados que não superam às expectativas.

 

 

Autoestima, modismos e fetichismo estético.

 

Nos dias atuais, atender às expectativas pode não ser mais o bastante para satisfazer até mesmo a desejos reais. É preciso superá-las. O problema é que a odontologia é idealizada para satisfazer às necessidades dentárias, desde pequenas resoluções estéticas até tratamentos de transformação de impacto. Entretanto, a projeção de problemas de autoestima, ou simplesmente atender aos modismos e fetichismos estéticos, pode ser só o começo para problemas e dores de cabeça.

 

Os maiores índices de satisfação com tratamentos estéticos odontológicos estão entre pacientes acima dos 40 anos de idade, e com extensas necessidades estéticas como restaurações dentárias amareladas, próteses dentárias escurecidas, retrações gengivas e até mesmo perdas dentárias. Situações em que as procedimentos estéticos vão além de satisfazer desejos ou resolver problemas de autoestima: são necessidades reais, e que interferem na vida social e profissional destes indivíduos.

 

 

De um lado, técnicas e materiais para tratamentos estéticos que evoluem a cada dia, do outro, pacientes cada vez mais insatisfeitos. O que pode estar acontecendo?

 

O que esperar dos resultados estéticos em tratamentos odontológicos quando telas de telefones celulares em ultra alta definição (full HD) são quase o padrão dos aparelhos atualmente vendidos? Dentes full HD? Pode soar engraçado, mas, de certa forma, esta é a expectativa para pacientes desejosos por transformações estéticas de impacto do sorriso. Ultrassimetria, cores próximas ao branco absoluto, cópias de sorrisos de artistas e modelos. Uma lista de exigências cheia de pontos suscetíveis a falhas, e frustrações.

 

 

Indivíduos jovens já são os pacientes mais frequentes nos serviços odontológicos para tratamentos estéticos.

 

Até certo ponto, a idade do paciente está relacionada com os índices de frustração frente aos resultados de tratamentos estéticos em odontologia. Quanto mais jovem o paciente, maior a insatisfação com os procedimentos. E isso acontece por diversos motivos, como as baixas necessidades estéticas, conceitos estéticos fora dos padrões de naturalidade e elevadíssimas exigências de resultados.

 

O modismo por tratamentos estéticos com facetas laminadas e lentes de contato dental é maior entre pacientes jovens. Nestes indivíduos, o perfeccionismo para resultados pode recair para dentes ultrassimétricos e em cores próximas ao branco absoluto. E são esses os motivos que recai sobre os pacientes mais jovens os resultados mais desastrosos, sendo bastante comum tratamentos que resultam na piora da estética do sorriso inicial do paciente. É por isso que pacientes muitos jovens não são indicados, na maioria das vezes, para tratamentos com facetas laminadas em porcelana.

 

 

O hábito por experiências de consumo no caminho para frustrações com os resultados dos tratamentos.

 

A publicidade é um fator modificador da sociedade, e com influências mais amplas do que a simples criação de novos desejos consumistas. Até mesmo as necessidades mais básicas são modificadas pela ação dela sobre os indivíduos. Deixar as experiências de consumo marcantes e inesquecíveis está entre as principais ferramentas para aumentar a satisfação na aquisição de produtos e serviços. O problema é que as expectativas por experiências marcantes com serviços também recai sobre os tratamentos odontológicos.

 

Um dos objetivos da odontologia – na verdade, o principal deles – é atender às necessidades odontológicas de saúde. É evidente que os serviços auxiliares de suporte ao atendimento de pacientes, como salas de espera confortáveis e design de serviços são importantes para facilitar o dia-a-dia de dentistas e pacientes. O problema é que os tratamentos em saúde não são desenvolvidos para serem experiências, mas sim para devolverem a normalidade e harmonia perdidas ao longo dos anos, sejam por doenças, traumas ou apenas os efeitos deletérios do tempo sobre dentes e gengivas.

 

 

Quando a personalização dos tratamentos já não satisfaz às exigências estéticas.

 

Na maioria das vezes, o paciente não consegue explicitar seus desejos estéticos para formatos e relações entre dentes, gengivas e lábios – até mesmo a cor dos dentes pode ser uma situação conflituosa. Em outras situações, e também muito comuns, as ideias para o design individual de detalhes dos dentes não harmonizam entre si. E estes são apenas mais alguns motivos para frustrações com os resultados estéticos dos tratamentos.

 

Sem referências reais para o desenvolvimento de formas e detalhes anatômicos importantes, dentistas e protéticos partem para harmonizações baseadas em evidências científicas e experiências profissionais na harmonização do sorriso. O problema é que, muitas vezes, o resultado final do tratamento não satisfaz às expectativas de realização estética pessoal dos pacientes. E o grande erro nesta etapa é que o paciente confunde a não satisfação pessoal com falhas no tratamento.

 

É neste momento que conflituam expectativas não superadas, desejos não realistas e limitações da ciência odontológica. Evidentemente, por vezes, inexiste a evidenciação, por parte dos dentistas, para as limitações estéticas dos tratamentos e a possibilidade real de não atender (superar) às expectativas e desejos dos pacientes – principalmente quando vão além dos fatores odontológicos. Em algumas situações, o não tratamento é o melhor tratamento.

 

 

Necessidades e desejos exigem abordagens diferentes.

 

Indivíduos com necessidades estéticas muito elevadas estão entre os pacientes mais satisfeitos com o resultados dos tratamentos. E não sem motivos, já que para essas pessoas a rearmonização do sorriso é essencial para as atividades sociais e profissionais. Porém, se engana quem pensa que esses pacientes não trazem desafios à satisfação com seus procedimentos. E principalmente quando outros problemas particulares são erroneamente associados com problemas odontológicos.

 

Pacientes em busca de resultados super simétricos e em cores claras próximas ao branco absoluto são fortes candidatos a não verem atendidas suas expectativas estéticas. É por isso que a maioria deles são jovens e já trazem razoável harmonia estética e de cores dos dentes. A conscientização desses indivíduos com  as limitações técnicas, riscos e objetivos dos tratamentos estéticos em odontologia é fundamental para eliminar desejos irreais para resultados, ou que saem do espectro odontológico e projetam-se sobre outros problemas sociais e pscicológicos dos pacientes.

 

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