Bruxismo e tratamento da dor e disfunção da ATM.
O bruxismo, uma das prováveis causas da disfunção da ATM, também é um potencializador dos sintomas da disfunção quando as causas podem ser artroses ou outros problemas. Este post trata do tratamento da dor e disfunção da ATM causada ou associada ao bruxismo.
Por Luís Gustavo Leite, dentista especializado em próteses dentárias pela Ufrgs, em Porto Alegre.
A articulação temporo-mandibular ou ATM é a articulação responsável pelos movimentos da mandíbula. Quando abrimos, fechamos ou fazemos movimentos, é essa articulação que garante a movimentação correta entre a mandíbula e o crânio. Infelizmente, essa articulação é passível de dores causadas por problemas articulares, musculares ou nevrálgicos cujos sintomas podem ser agravados pelo bruxismo.
A ATM é uma articulação semelhante à articulação do joelho, exceto pelo fato de que a mandíbula possui dois pontos de conexão articulares com o crânio – uma direita e outra esquerda. Isso modifica um pouco o curso das doenças porque uma articulação sempre influencia o funcionamento da outra.
A ATM é composta por três ossos – um é a mandíbula, e a parte dela em contato com o crânio chama-se côndilo. Os outros dois ossos são os parietais e que estão localizados bilateralmente aos ossos do crânio. O parietal é um osso lateral da face que, no local aonde a mandíbula precisa apoiar-se para fazer os movimentos de abertura, tem o formato de uma cavidade.
Note que esse esquema de articulação entre a mandíbula e o crânio acontece nos dois lados de nossa cabeça, próximo aos ouvidos – é por isso que alguns pacientes relatam dor de ouvido. Além desses ossos, existem um disco articular – uma cápsula cartilaginosa que evita o contato direto entre os ossos – e os ligamentos, que unem esse disco ao côndilo da mandíbula. Qualquer uma dessas estruturas pode sofrer lesões que variam de leves a severas, dando origens a sinais e sintomas diferentes, principalmente a dor.
A associação do bruxismo com a ATM.
O bruxismo é uma atividade indesejada dos músculos envolvidos na mastigação. O bruxismo é normalmente confundido com a disfunção da ATM, porém ambos são situações diferentes entre si. Entretanto, é possível que um bruxômano – indivíduo com sintomas característicos do bruxismo – também manifeste as disfunção da ATM, e vice-versa. Quando o paciente com bruxismo também apresenta episódios frequentes de dor ou limitações de abertura e fechamento da mandíbula, a disfunção da ATM é um problema presente e que pode estar associada ao próprio bruxismo.
É preciso saber que a disfunção da ATM pode existir de forma independente do bruxismo. Fatores anatômicos locais, traumas, acidentes, artrites e artroses são exemplos de fatores causais da disfunção da ATM, tanto pela limitação funcional como pelo aparecimento de dor.
Nem todo paciente com bruxismo vai evoluir para a disfunção da ATM, mas os episódios constantes de apertamento e ranger dos dentes associados ao estresse psicológico são fatores que podem levar à disfunção da ATM. E também é possível ao paciente bruxômano desenvolver algum tipo de dor muscular sem a presença de disfunção da ATM.
Nessa situação, a dor se dá nos músculos que não estão envolvidos diretamente com as articulações, como os pteriogoideos. O bruxismo normalmente desenvolve algum tipo de dor ou desconforto aos músculos masseter, bucinador e temporal ( que é o músculo que provoca dores de cabeça ).
A disfunção da articulação-temporomandibular ( DTM ).
A disfunção da articulação temporo-mandibular é um distúrbio que envolvem os músculos mastigatórios, a articula temporo-mandibular e as estruturas associadas.
• SINTOMAS.
Dores na face, ATM e/ou músculos mastigatórios, dores na cabeça e na orelha. Também pode haver manifestações otológicas como zumbidos e vertigens.
• SINAIS.
Sensibilidade muscular e da ATM à palpação, ruídos articulares e limitação de movimentos mandibulares ( abrir, fechar ou laterais ).
• DIAGNÓSTICO.
A presença de dores musculares, ouvido e cabeça, a dor espontânea ou à palpação na região da articulação e as limitações de abertura da mandíbula estão associados ao diagnóstico.
• ETIOLOGIA.
Assim como o bruxismo, a DTM tem origem multifatorial. Existem fatores que causam a instalação da DTM, outros aumenta e outros são perpetuantes. Os TRAUMAS, os FATORES PSICOSOCIAIS como a ansiedade e a depressão e os fatores FISIOPATOLÓGICOS como doenças degenerativas, endòcrinas, reumáticas, vasculares, alteração de viscosidade do líquido sinovial e até mesmo fatores genéticos são responsáveis pelo aparecimento, aumento ou perpetuação da DTM.
O tratamento da dor associada ao bruxismo e à DTM.
A dor orofacial é um problema mais comum do que pode imaginar. Estudos epidemiológicos estimaram que 22% da população brasileira já teve algum tipo de dor na boca ou na face em um período de 6 meses, que 12% teve algum tipo de dor odontogênica e que 5% da população teve dores relacionadas à disfunção temporo-mandibular ( DTM ), nesse mesmo período de 6 meses estudado.
O tratamento da dor, tanto para o bruxismo quanto para a DTM, pode, em algumas situações, ser o mesmo. É preciso que o diagnóstico seja preciso – apesar da inexatidão do diagnóstico que diferencia ou mostre independência entre os dois, e até mesmo da própria existência da DTM.
O fato é que, quando a dor está presente – independente ou não da existência de bruxismo associado, um tratamento de referência consiste em medicar relaxantes musculares, ansiolíticos ou corticóides, aplicar compressas quentes e úmidas na região dolorida e o paciente passar para uma dieta mais macia para que os músculos da mastigação não sejam muito exigidos.
Passado esse primeiro período de remissão da sintomatologia dolorosa, passa-se para a identificação de outras causas potenciais e de seus tratamentos específicos, que podem incluir desde simples mudanças em hábitos não saudáveis – como morder canetas, tratamentos com placas oclusais (macias ou rígidas, conforme a causa), cirurgias (para os casos de fraturas ou danos maiores às estruturas articulares) ou o uso de fármacos para situações de artrose ou artrite. Exames radiográficos e endocrinológicos são importantes auxiliares ao diagnóstico do problema.
• DIETA MACIA, COMPRESSAS QUENTES E MEDICAÇÕES.
São os primeiros cuidados a serem tomados quando a dor está presente, em qualquer situação. Na dieta macia o paciente evitar alimentos difíceis de serem mastigados e opta por uma dieta com cremes, sopas e legumes cozidos. As compressas quentes aplicadas sobre a região auxiliam na ação dos medicamentos e proporcionam conforto muscular. As medições – relaxantes musculares são os mais recomendados – aliviam as dores até que o quadro diminua.
• PLACAS PARA BRUXISMO.
As placas oclusais miorrelaxantes, popularmente conhecidas como placas para bruxismo, ao contrário do bruxismo, são pouco utilizadas quando a causa da dor é o distúrbio temporomandibular ( DTM). Na DTM a placa macia ( resiliente ) é indicada porque o aumento da força muscular minimiza em quase 90% dos pacientes com DTM a sintomatologia dolorosa. No paciente com bruxismo o uso da placa macia é contra-indicada. Daí a importância do correto diagnóstico da causa da dor orofacial, dado que a indicação de placas inadequadas podem aumentar as dores orofaciais.
• MUDANÇAS DE HÁBITOS E POSTURAIS.
Hábitos como mascar chicletes, roer unhas ou morder pontas de canetas são fatores de risco para o desenvolvimento de bruxismo e o aparecimento de dor. A postura corporal pode comprometer a musculatura do pescoço e até mesmo a facial, e deve ser reprograma para uma melhor harmonia muscular e postural. Cuidados adicionais para os exímios praticantes de musculação com finalidade de hipertrofia, pelo aumento significativo da força muscular dos músculos faciais e do pescoço.
• TRATAMENTO DA ANSIEDADE.
A ansiedade é um dos principais fatores responsáveis pelo aparecimento da dor e da disfunção da ATM. Quando a ansiedade está associada ao bruxismo, os risco de desenvolvimento de lesões na ATM são elevados. A ansiedade também é a responsável pelos surtos da atividade muscular no bruxismo.
• TRATAMENTO CIRÚRGICO.
As cirurgias no tratamento da disfunção da ATM são utilizadas em casos extremos, principalmente quando a função está comprometida. Nesses pacientes os movimentos de abertura e fechamento está bastante limitado, e em muitos casos associado a dores crônicas e intensas. Os casos de fratura e artroses podem necessitar de intervenções cirúrgicas na ATM, uma região complexa para ser acessada cirurgicamente.
• LASER, LED e TOXINA BOTULÍNICA.
O laser de baixa potência e o LED possuem efeito analgésico sobre a dor na DTM. Ambos são terapias auxiliares interessantes que podem ser empregadas quando as medicações, por algum motivo, não podem ser utilizadas nesses pacientes. Já a toxina botulínica é utilizada com o efeito de relaxamento muscular, mas com uma indicação que deve ser muito restrita, já que seus efeitos duradouros podem impedir novos diagnósticos e até mesmo alterar o aumentar o percurso da disfunção pelo mascaramento do problema.
O bruxismo associado à dor muscular.
A dor muscular pode ser frequente aos pacientes com bruxismo. Quando essa dor é crônica a suspeita da DTM deve ser aprofundada e examinada. Porém, dependendo da intensidade do bruxismo e da potência muscular individual, os bruxômanos podem experimentar episódios de surto de maior intensidade de atividade muscular. Esses episódios estão normalmente associados ao estresse psicológico. A frequência maior desses surtos pode levar o paciente a desenvolver uma disfunção da ATM e riscos de transformação a dor em uma situação crônica. Surtos eventuais podem ocorrer e não desenvolver danos às estruturas da ATM.
• ESTIRAMENTO, CONTRATURA E DISTENSÃO.
Todas essas lesões também acontecem na musculatura relacionada à mastigação. A contratura é a lesão que mais acomete o músculo masseter – que é o grande músculo lateral do nosso rosto, junto à mandíbula – e é relatada pelos pacientes como o travamento da mandíbula, em que, por alguns minutos ou até mesmo horas, o paciente simplesmente não consegue abrir a boca. No estiramento e distensão a persistência da dor pode durar dias se nenhuma providência ou cuidados forem tomados.
• TORCICOLOS.
Estiramentos, contraturas e distensões musculares também são frequentes aos músculos do pescoço. Os bruxômanos, na maioria das vezes, não notam a relação entre o seu bruxismo e a ocorrência frequente de torcicolos. Isso acontece porque os músculos do pescoço participam dos movimentos mandibulares relativos ao bruxismo ( e à mastigação ), e são muito exigidos durante a atividade de apertar ou ranger dos dentes.
O que fazer nos episódios de dor intensa associada ao bruxismo.
Os episódios de dor intensa recebem atenções iniciais que podem iniciar já na casa do paciente. Lembrando da importância de procurar um dentista após a ocorrência de episódios múltiplos e frequentes de períodos de maior atividade muscular como o apertamento e ranger dos dentes, adota-se as medidas já descritas como a dieta macia, aplicação de compressas quentes sobre as regiões com dores e utiliza-se relaxantes musculares.
Tendências atuais nos tratamentos das disfunções da ATM associada à dor e ao bruxismo.
As abordagens para o tratamento das disfunções da ATM associadas à dor – independentemente da presença ou associação do bruxismo como causa – seguem a tendência para tratamentos mais conservadores, ou seja, menos cirúrgicos. A abordagem cirúrgica teve seu auge na década de 90 e até a década passada.
A dificuldade técnica em lidar cirurgicamente com as estruturas minúsculas e complexas da ATM implicam, muitas vezes, em resultados pouco animadores. As cirurgias são utilizadas em casos de fraturas por acidentes ou estados avançados de artrites e artroses que provocam estados dolorosos intensos ou dificuldades de mastigação ou fala incompatíveis com uma vida normal.
O uso de medicações anti-inflamatórias, mudanças nos hábitos posturais e alimentares, fisioterapia e uso de placas articulares de estabilização e proteção como as placas para bruxismo são, em conjunto, um protocolo seguro, relativamente previsível e eficaz no tratamento e prevenção da evolução dos sintomas de problemas e dores na ATM, associadas ou não ao bruxismo.
“Esses posts são escritos exclusivamente com a finalidade de divulgar o conhecimento científico odontológico e não devem servir como diagnóstico para tratamentos ou escolha de técnicas odontológicas. Consulte o seu dentista.”
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